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17 de abril de 2019

Homilia de Dom Paulo na missa do Santo Crisma e Renovação das Promessas Sacerdotais


Bênção dos Santos Óleos – Catedral de São Mateus – 16/04/2019

– Excelentíssimo Dom Aldo, Reverendíssimos e amados filhos Presbíteros, Religiosos e Religiosas, Seminaristas, representantes das paróquias, autoridades constituídas ou representadas e todo povo santo de Deus. Minha saudação também aos queridos ouvintes da Rádio Kairós (a rádio da família) e demais meios de comunicação social. Rezemos hoje pela nossa Igreja, pelo nosso Brasil e pelos cristãos da França, que sofrem neste momento pelo incêndio que atingiu a Catedral de Notre Dame em Paris, um dos maiores símbolos da cristandade no mundo.

– Amados presbíteros e povo de Deus, nesta missa dos santos óleos e renovação das promessas sacerdotais, o Espírito de Deus vem ao nosso encontro, deseja habitar em nosso coração e realizar o novo em cada um de nós. “O Espírito do Senhor está sobre mim, porque ele me consagrou com a unção, para anunciar a Boa Nova aos pobres; enviou-me para proclamar a libertação aos cativos e aos cegos a recuperação da vista; para libertar os oprimidos e para proclamar um ano da graça do Senhor.” (Lucas 4,16-21).

– Para vivermos bem a nossa fé sob a ação do Espírito Santo de Deus, frente aos ataques que a Igreja, de modo particular os seus representantes, vem sofrendo constantemente nos últimos anos, profiro algumas palavras a todos, mas em especial aos filhos presbíteros, que também sofrem em sua missão. Além da Bíblia, do Magistério da Igreja e da experiência pastoral, tomarei como base de interpretação o texto de Dom Pedro Brito Guimarães (DP). Seguirei uma metodologia simbólica em sete pontos:

1) Presbítero, homem da Palavra e de palavra – Ao presbítero, homem da Palavra, é exigido solenemente: “Viver à altura do evangelho de Jesus Cristo” (Fl 1,27a).

– Quando ainda seminarista, ao ser-lhe conferido o ministério de leitor, recebe o livro da Sagrada Escritura com as seguintes palavras: “Recebe este livro da Sagrada Escritura e transmite com fidelidade a Palavra de Deus, para que ela possa frutificar cada vez mais no coração das pessoas” (Pontifical Romano, Paulus, 2008, n. 250).

– No rito da ordenação diaconal, é entregue novamente ao candidato o livro dos evangelhos, com estas palavras: “Recebe o evangelho de Cristo, do qual foste constituído mensageiro: transforma em fé viva o que leres, ensina aquilo que creres e procura realizar aquilo que ensinas” (idem, n. 174).

– Na ordenação presbiteral, o candidato é interrogado se quer, “com dignidade e sabedoria desempenhar o ministério da Palavra, proclamando o evangelho e ensinando a fé católica” (idem, n. 126).

– E, por fim, na ordenação episcopal, sob a cabeça do bispo, é colocado o evangelho com as palavras seguintes: “Recebe o evangelho e anuncia a Palavra de Deus com toda a constância e desejo de ensinar” (idem, n. 94).

O cuidado com a Palavra é a marca do ministro ordenado.

– Sendo assim, o presbítero é considerado na Igreja, o homem da Palavra, da vivência, do anúncio e da missão da Palavra. A Palavra de Deus e a palavra da Igreja são tudo na vida do presbítero e em sua missão (cf. DP).

Conclamo aqui, a cada presbítero a acolher o clamor do Papa Francisco (Evangelii Gaudium, n. 78): “não deixemos que nos roubem o evangelho” (idem, n. 97). Quem está roubando o evangelho de nós? Quem está deixando roubá-lo? Como é que se rouba ou se deixa roubar o evangelho?

– Num mundo marcado por tantas informações, por tantas palavras, o presbítero é convidado a ser o homem da palavra e de palavra. Palavra de Deus encarnada e autenticidade em suas próprias palavras, pois “a Palavra tem uma voz: A REVELAÇÃO; tem um rosto: JESUS CRISTO; a Palavra tem uma casa: A IGREJA; é um caminho: A MISSÃO” (cf. Mensagem final do Sínodo dos Bispos sobre a Palavra).

– Querido presbítero, seja eternamente o homem da Palavra e de palavra. Não deixe que ninguém lhe roube o instrumento nobre de maior comunicação do Reino: a Palavra.

2) Presbítero, pai espiritual, por amor e no amor – O presbítero sendo homem da Palavra e de palavra, aprende automaticamente o que significa amar e exercer bem sua paternidade espiritual.

O amor é o sentimento mais difundido no mundo. O amor é o mandamento mais conhecido em todo o universo. O amor é a ação mais praticada no mundo, mais do que o ódio, a vingança, a violência e tantos outros sentimentos. O amor é o nome do Deus cristão (1Jo 4,8). Os românticos têm o amor em suas canções como palavra preferida. Os pais vivem para amar. Os sábios têm o amor como a palavra-chave. Os mártires morrem por amor (cf. DP). O presbítero se embriaga do amor, porque é chamado e enviado para amar.

– O amor é a seiva de uma vida autêntica e verdadeira na vida do presbítero e de cada cristão. Só o amor constrói e liberta para a vida plena. Só o amor conduz à vida feliz junto de Deus. O amor é a única virtude que permanecerá para sempre.

– O amor é a síntese de tudo na vida do presbítero e em sua missão. O presbítero exerce a função de pai espiritual da comunidade eclesial. E chamar o presbítero de pai é uma das expressões mais belas de amor, de carinho e de reconhecimento dos seus filhos que amam. “O padre é o amor do coração de Jesus” (São João Maria Vianney). É pai, porque ama e ama porque é pai (cf. DP).

– Ao assumir tal paternidade, toma consciência que seu ministério passa primeiramente pelo amor, mas não está isento da dor e da cruz. Muitos querem um cristianismo sem cruz, um ministério sem dor. Querer um cristianismo sem dor, sem cruz e sem morte é uma das maiores tentações do nosso tempo, além de muitos leigos (as), incluo aqui também alguns bispos, presbíteros, diáconos, religiosos e religiosas. Não queiramos um Cristo sem cruz, nem uma cruz sem Cristo. Queiramos ao contrário, a nossa cruz na cruz de Cristo e Cristo na nossa cruz, pautados na plenitude do mesmo amor. Não existe Quaresma sem Páscoa e nem Páscoa sem Quaresma. Hoje, muitos fiéis exigem do presbítero posturas de super-heróis, negam sua humanidade. São incapazes de perceber que o presbítero também sente dores, passa pela cruz, pelo calvário, sofre pelas tentações, quedas e mortes. Alguns fiéis são incapazes de se sensibilizar com suas quedas. Se existe um calvário na vida e missão do presbítero, a cruz será sempre o amor, porque ele é chamado do meio do povo por amor e para amar. A cruz é o altar da obediência e entrega total de Jesus, que dá brilho, encanto e alegria a ressurreição, alimenta e motiva o presbítero para a vida e missão.

3) Presbítero, homem unido a Jesus como o ramo à videira – Para estar fortalecido na missão e acolher com amor as cruzes da vida, o presbítero deve estar unido a Jesus como o ramo à videira. Quando o amor é o princípio e o fim na missão do presbítero, ele se torna um homem pleno na comunhão e na unidade com Jesus.

– ‘Videira sem ramos não existe e nem ramos sem tronco, para que um ramo possa produzir frutos, deve estar unido à videira. Só assim consegue receber a seiva. “Sem mim, vocês não podem fazer nada” disse Jesus (Jo 15,5b). O presbítero, pelo sacramento da ordem, se une e se incorpora a Cristo como o ramo no tronco da videira’ (cf. DP).

– ‘Enquanto o presbítero estiver ligado a Jesus, o Tronco, recebe dele a seiva, que vem do Pai e produz frutos de vida, paz, justiça e libertação. Ao se desligar e se distanciar de Jesus, do Amor do Pai, sua vida perde sentido e encantamento, seu ministério seca e morre. Unido a Cristo, o presbítero glorifica ao Pai com suas ações pelo Reino’ (cf. DP).

– Estar ligado aJesus, é permitir-se as podas. Todo ramo que em Jesus não produz fruto, o Pai o corta. Ramo que não produz fruto é cortado, seca e é recolhido para ser queimado. Assim como o agricultor limpa e purifica a videira pela poda, Deus nos purifica pela Palavra de seu Filho, Jesus Cristo.

– O que acontece com uma videira, acontece também na vida do presbítero, que também deve passar por boas podas, para produzir bons frutos. A poda é dolorosa, mas necessária. Ela purifica o presbítero, para que cresça e produza mais frutos.

– “Para que o presbítero permaneça na Igreja, unido a Cristo e produza frutos, é necessário um trabalho manual e artesanal de poda de um agricultor zeloso e dedicado. “A vocação é como um ‘diamante bruto’ a ser lapidado, para que brilhe em meio ao povo de Deus” (cf. DP).

– Quando o presbítero e cada um de nós, na obediência, nos permitimos as podas, o resultado é e será sempre a colheita de bons frutos. O resultado natural quando um ramo permanece ligado à videira, é dar frutos. Uma boa poda nos leva a colher bons frutos. Que cada presbítero, como ramo da videira, esteja sempre ligado ao Tronco Jesus, permitindo às podas necessárias, para saborear boas colheitas.

4) Presbítero, homem “consumido” como a eucaristia – “Se o grão de trigo que cai na terra, não morre, fica só, mas se morre, produz muito fruto” (Jo 12,24). A uva transformada em vinho e o trigo transformado em pão, além de serem dois símbolos eucarísticos, são símbolos da vida e da missão de um presbítero. Como disse o padre Chevrier, “o padre é um homem consumido”. Assim como a Eucaristia é consumida pela fé, o presbítero é consumido por ser um homem de fé.

– ‘A eucaristia é o próprio Jesus, sua pessoa, sua vida, seu corpo e seu sangue, entregues por nós. Na eucaristia estão contidas toda a vida e toda a missão de Jesus’ (cf. DP). A eucaristia é o próprio Cristo e fala de Cristo (“Eu sou o pão da vida”) (Jo 6,35). 

– ‘A eucaristia é o grande presente que Cristo, o esposo, deixa de herança à Igreja, sua esposa, no dia da sua despedida (SC 47). A Igreja sempre foi concebida como o corpo de Cristo. Jesus, por meio da eucaristia, funda a Igreja como comunidade da nova aliança. A Igreja vive da eucaristia. Ela sempre foi considerada o “sacramento da Igreja”: a eucaristia faz a Igreja e a Igreja faz a eucaristia’ (cf. DP). Não se vive nenhum ministério e “não se edifica nenhuma comunidade, se não tiver a sua raiz e o seu centro na eucaristia” (PO 6).

– O presbítero neste sentido, é por excelência, o homem da eucaristia e consumido cotidianamente como a Eucaristia, por ministrar os sacramentos na Igreja e cuidar de seus fiéis, que se alimentam espiritualmente da Eucaristia. O presbítero não é só as mãos que consagram, mas a Eucaristia, que se consome no amor e na missão.

5) Presbítero, o homem da oração – Em seu discurso com os jovens presbíteros (01/06/17), o Papa Francisco, ressaltou a importância da oração para cada sacerdote: “A oração, a relação com Deus, o cuidado da vida espiritual dão alma ao ministério, e o ministério dá corpo à vida espiritual: o sacerdote se santifica e santifica os outros no exercício concreto do ministério, especialmente rezando e celebrando os Sacramentos” (Papa Francisco).

– Quase todos os milagres de Jesus acontecem após uma profunda intimidade com o Pai, através da oração. Todo presbítero é convidado a esta intimidade cotidiana com o Pai e aencontrar tempo para se ‘entreter’ com a Palavra de Deus, através da Lectio Divina. O presbítero deve fazer de sua vida e de seu ministério uma oração.

6) Presbítero, homem atento aos sinais dos tempos complexos – O cenário político, o mau uso das redes sociais, o desemprego, a injustiça social, a pobreza e o desrespeito ao ser humano são os maiores sinais de complexidade do nosso tempo.

– Hoje, temos o seguinte panorama da Igreja no Brasil: 277 Dioceses; 322 Bispos (sem contar os eméritos +- 150); 9.000 Padres Religiosos; 16.000 Padres Diocesanos; 11.800 Paróquias; Aproximadamente 80 a 100.000 Comunidades; 210 milhões de habitantes (aproximadamente Conf. IBGE: 209.781.021 Habitantes até 15/04/19).

– Aparentemente é um quadro significativo, mas se torna pequeno diante do número de habitantes e da complexidade da missão, por isso se faz necessário, que todos os leigos e leigas evangelizados abracem a missão com seus pastores, senão seremos engolidos pelos sinais dos tempos. Principalmente por algumas figuras, que acham que são donos do mundo e tudo que pensam ou escrevem, podem soltar na mídia. O que mais nos assusta e nos preocupa, são os que se dizem católicos, se deixam levar por estas figuras, falam mal de sua própria Igreja e principalmente de seus representantes. (Papa, bispos, presbíteros, religiosos e religiosas). Perdeu-se o respeito pelo ser humano e por aqueles que possuem, em nome de Jesus, a missão de cuidar do ser humano.

Muitos se esquecem de que o presbítero foi escolhido no meio do povo, para o serviço do mesmo povo. São humildemente humanos.

– Porisso, ‘o presbítero participa e deve participar sempre da missão de Jesus. Não se devem esquecer nunca estas palavras de Jesus: “Sem mim, nada podeis fazer” (Jo 15,5). Só com Jesus podemos realizar o nosso ministério. Sem Jesus não temos nada nosso para oferecer às pessoas; não somos nada sem o Senhor; nada podemos fazer sem obedecer ao Senhor e comungar com ele’ (cf. DP). É nesta comunhão com Jesus que aprendemos a lidar com os sinais dos tempos complexos.

– ‘O presbítero deve viver em sua própria pele as contradições, as fragilidades, as expectativas e as esperanças do seu tempo com todas as suas complexidades. O importante é não fazer um pacto com a mediocridade, mas viver na medida alta do evangelho. É necessário que sejamos presbíteros enamorados do nosso sacerdócio, conquistados pelo ideal de serviço, a exemplo de Cristo Pastor, bom e servo por amor’ (cf. DP). “que veio para servir e não ser servido” (cf. Mc 10,45).

– “Ser sacerdote significa arriscar a vida pelo Senhor e pelos irmãos, carregando na própria carne as alegrias e angústias do povo, dedicando tempo e escuta para curar as feridas dos outros, oferecendo a todos a ternura do Pai”. (Papa Francisco).

7) Presbítero, o homem do altar (Altar Templo e Altar povo) – Amado presbítero, sede Zeloso na Eucaristia de cada dia; como disse o abade Dom Filipe: não ‘sapecar’ as coisas; estar inteiro, pleno. Missa simples, tranquila, sem adornos, mas tudo com muito amor. Onde há um sacerdote, deve haver alegria; bom humor; mostre que Deus é capaz de preencher o coração; mostre que não procura a não ser na Igreja outro lugar para a felicidade. Que não haja entre vós, rosto triste, desgostoso e insatisfeito. Reconhecer que temos dificuldades, noites escuras e vazias, declínio das forças, mas nossa alegria está no rosto de Cristo. “Quando eu sou fraco, aí é que eu sou forte”, diz Paulo em sua segunda carta aos Coríntios (2Cor 12,10). Esteja sempre inteiro e com encantamento para o serviço do Altar no Templo e no Altar da vida: o povo que lhe foi confiado. Assim seja! Amém!

Nesta missa da unidade, sob a luz do Espírito Santo clamo a Deus bênçãos e graças a todos.

São Mateus! Rogai por nós!

     DOM PAULO BOSI DAL’BÓ
BISPO DIOCESANO

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