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Comunicação sobre as Cebs na Diocese de São Mateus

1) A intenção é mesmo uma breve comunicação, sem pretensões de exemplaridade ou de propaganda, baseada nas memórias genéricas pessoais, sem documentação e com dificuldade de escrever, para atender à insistência de pessoas amigas.

2) A Diocese de S. Mateus começou a se interessar pelo assunto sem muitas luzes teóricas Comunidades eclesiais de base: o que é isto? Era a nossa pergunta. E a luz veio do Documento conclusivo dos bispos em Medellín. “A comunidade cristã de base é o primeiro fundamental núcleo eclesial, que deve” em seu próprio nível, responsabilizar-se pela riqueza e expansão da fé, como também pelo culto que é sua expressão. “É ela, portanto, célula de estruturação eclesial, foco de evangelização e atualmente fator primordial de promoção humana e desenvolvimento” (Conclusões de Medellín, 15,10). A citação não é a única passagem de Medellín sobre o assunto.

3) A partir dessas luzes, ainda longe de serem suficientemente concretas e atentos à nossa realidade de então (anos 60-70) totalmente rural, com pequenos núcleos humanos, quase que perdidos na imensidão da floresta Atlântica, soberba e rica de madeira de lei em ritmo acelerado de extração, optamos pelas pequenas comunidades eclesiais. Não tínhamos clareza de como proceder. Partimos então das poucas capelas existentes na abertura das clareiras no meio das matas de povoados mínimos dos imigrantes chegando e ocupando as terras, portadores de saudades das práticas religiosas de suas origens. Eram pontos de referência necessários e importantes naquele momento e pareciam ser o único caminho possível. As florestas iam: as terras vinham sendo ocupadas, pelo grande e desordenado fluxo de imigrantes, as capelas iam se multiplicando. Eram os melhores lugares para o povo se encontrar nos domingos e nas festas. Muitas vezes era uma escolinha ou um ambiente colocado à disposição por pessoas mais esclarecidas, ou até mesmo uma árvore maior. Lá o povo fazia sua “reza” comunitária, recebendo com grande entusiasmo o padre que celebrava a Eucaristia. A “reza” era inicialmente, o terço: mais tarde o culto ou celebração da Palavra: tudo e sempre dirigido por algum líder leigo do lugar. Foi o início. O começo de um processo sem fim, como apareceu imediatamente. A Diocese adotou um critério, que nunca foi escrito, mas seguido em todo o território geográfico da Diocese: o povo não deveria caminhar mais que 2-3 horas sem encontrar algum sinal da presença da Igreja.

4) Das mais ou menos 100 capelas iniciais chegamos ao número de mais de 700 capelas ou lugares para as práticas religiosas das comunidades, incluindo as comunidades das cidades, geralmente surgidas nos bairros, umas pela iniciativa dos pastores (clero e Irmãs religiosas) outras (a maioria) pelo zelo de algum leigo interessado que acostumado a frequentar a CEB no interior, quando emigrado para a cidade inconformado com a ausência da mesma, partia para encaminhar uma solução, organizando o culto na rua, até encaminharem sua própria igreja.

5) Com esta memória muito simplificada fica bem claro o caráter geográfico, de vizinhança das nossas CEBs, que nunca se impôs ao povo com delimitações ou obrigações de qual comunidade frequentar.

6) Entendemos que as CEBs devem ter condições para realizar, em seu nível, as três funções fundamentais da Igreja: evangelizar, celebrar e entrar com tudo no enorme campo da pastoral social. Condições mínimas para funcionar: que exista algum grupo de reflexão, um ou mais, de acordo com o tamanho da população local. Há CEBs muito grandes com mais de 10 grupos de reflexão. Outras, bem pobres e pequenas custam a entender, até por falta de alguém que saiba ler, sendo a maioria de analfabetos. Chegamos a contar em volta de 2.000 grupos de reflexão. Muitos abandonaram: hoje estão retomando. Há episódios tocantes em volta dos grupos. Outras condições: que haja o culto, e que tenham perspectiva de sobrevivência em todos os sentidos. O secretariado de pastoral prepara os subsídios para os grupos, além da folha semanal do culto. Já produziu ótimo material.

7) E os padres? Visitam as CEBs, uma por uma, todo mês, ou cada dois meses, e no caso pior cada três meses de acordo com as possibilidades dos servidores da paróquia. A visita do padre sofreu muitas mudanças, avanços e recuos de acordo com as condições complexas dos tempos e diante do impossível pela excessiva carga de serviços. Em meus tempos de auxiliar de uma paróquia, o padre dava uma aula de catequese às crianças, conferia a situação com os animadores, confessava quantos queriam, celebrava a Eucaristia, batizava, assistia casamentos e visitava doentes, se necessário. Trabalho pesado e muito seguido nos primeiros tempos. Hoje é muito menos o que se espera do padre, pelo fato de a comunidade já ser servida por animadores capazes e disponíveis. Em compensação, as visitas são mais frequentes, mais rápidas, até mesmo pelo fato de as estradas serem melhores e as comunicações, em geral, mais facilitadas. Nos meus tempos de serviço na paróquia o meio de transporte mais usado era o cavalo.

8) O esquema referencial de nossa pastoral era fundamentalmente baseado nos quatro itens principais:

– Primeiro: Evangelização pelos meios de nosso alcance: grupos de reflexão, catecismo, reuniões das irmandades, de casais, culto etc.

– Segundo: Renovação sacramental. Este item mereceria um capítulo extenso e aprofundado. Houve um certo rigor, falhas e desacertos, às vezes imposições de condições difíceis para o Batismo, hoje felizmente superadas. É de notar que os leigos foram sempre mais duros que o clero.

– Terceiro: Formação de Líderes. Cada paróquia tinha seu Centro de Formação, além do Centro Diocesano para os encontros maiores. Esses Centros continuam mais simplificados. Chegamos a cursinhos de 15 dias seguidos, em regime fechado. Naquele tempo os centros paroquiais tinham disponibilidade de dormitórios e hospedagem completa. Hoje, só o centro diocesano continua como o passado.

– Quarto: Dízimo, como fonte de manutenção dos agentes pastorais (padres e funcionários) e de toda a máquina (Seminário, Cúria etc.) Inicialmente não era assim. As CEBs seguiam o método tradicional para arrecadar os meios de sobrevivência, isto é: festas, taxas de serviços, espórtulas etc. Mais tarde, após o aparecimento da ideia do dízimo, assumimos com decisão radical a “antiga” novidade. Abandonamos todas as espórtulas e taxas pelos serviços. Total gratuidade pelos Sacramentos e pelos serviços de secretaria. Desencorajamos as festas para fins econômicos chegamos a
proibir literalmente comprar ou aceitar prêmios caros pelo tradicional bingo, sobretudo se oferecidos em tempo de campanha eleitoral. Todos foram convidados o contribuir com o dízimo, com total estímulo a desistir de outras iniciativas. Sugerimos, não obrigamos, a contribuir com dois por cento para quem vivesse de rendas e o valor de meio dia de serviço para os assalariados. Há mais de trinta anos está funcionando em todas as CEBs, paróquias e diocese. A contribuição do dízimo é mensal e é recolhida com extremo rigor, mediante carteirinha personalizada. Mas sempre livre. O sistema andou melhorando, tornando claras as finalidades; 15% à cúria; 30-40% à sede paroquial e o resto à disposição da própria comunidade. É tudo perfeito? Não é, nem pode ser. É caminho, pequena peça da organização eclesial, que precisa sempre se renovar e converter. Tocar o coração da pessoa. Entretanto podemos afirmar (penso sem excessivas ilusões) que nossas paróquias são comunidades de comunidades, as quais, na necessidade de sua sustentação, vivem do dízimo. Há falhas exigindo passos corajosos e há não fácil realização. Cito um que muito me faz pensar. O dízimo não conseguiu ainda adotar a solidariedade desejável entre CEBs maiores e de mais recursos e as mais humildes que nem conseguem pagar as despesas para a sobrevivência: água, luz etc.

9) Uma característica bem visível: As CEBs funcionam pela dedicação de seus animadores. O padre não está ausente nem a paróquia. Entretanto a função do padre não é de monopolizar e controlar tudo; mas servir especialmente na contínua formação do povo e seus animadores.

10) Foi de grande estímulo o encorajamento do Papa João Paulo II quando de seu discurso aos Bispos do Leste 2 no dia 20 de novembro de 2002, na visita ad limina. Eis suas palavras: “De resto, é neste sentido que as comunidades eclesiais capixabas vem favorecendo o enriquecimento da vida eclesial no seu Estado. Também a elas desejo fazer constar o meu louvor e estímulo pela obra evangelizadora que estão realizando” (CNBB. Palavras de João Paulo II aos Bispos do Brasil, pg. 87).

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