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Por que as imagens são veladas na quaresma?

Seminarista Rafael Charile Capucho, 2º ano de Filosofia, etapa do Discipulado.

No mistério pascal está a centralidade de tudo que a Santa Mãe Igreja celebra, a memória sagrada da obra de salvação do seu divino Esposo, Nosso Senhor Jesus Cristo. Como nos afirma a Constituição Conciliar Sacrosanctum Concilium, sobre a Sagrada Liturgia, “Em cada semana, no dia a que chamou domingo, celebra a da Ressurreição do Senhor, como a celebra também uma vez no ano na Páscoa, a maior das solenidades, unida à memória da sua Paixão” (n. 102). Faz-se, portanto, necessária uma digna preparação, pela escuta mais frequente da Palavra de Deus, da oração mais intensificada e da penitência, para que os fiéis possam celebrar dignamente estes santos mistérios.

O costume de velar as imagens e cruzes das igrejas é antigo. Chamada também de “Velatio”, esta tradição acontece de forma oficial desde a publicação da edição oficial do Missal Romano, aprovada pelo Papa Pio V em 1570, no contexto do Concílio de Trento. Aquela edição permaneceu em vigor até a promulgação do novo Missal Romano, pelo Papa Paulo VI, em 3 de abril de 1969. As seis edições típicas, desde a de 1570, até a publicada em 1962, prescreviam como obrigatoriedade cobrir as cruzes e imagens, mas, a partir da edição de Paulo VI, não está mais prevista esta obrigatoriedade, ficando a juízo das Conferências Episcopais se esse costume é mantido ou não em cada região, de acordo com a cultura local.

No Brasil, de acordo com a tradução da 3ª edição típica latina do Missal Romano, estas orientações podem ser encontradas nas rubricas do quinto Domingo da Quaresma (pág. 204, em português), bem como na Carta Circular da Congregação para o Culto Divino Paschalis Sollemnitatis: A preparação e celebração das festas pascais, de 16 de janeiro de 1988, que diz:

O uso de cobrir as cruzes e as imagens na igreja, desde o quinto domingo da Quaresma, pode ser conservado segundo a disposição da Conferência Episcopal. As cruzes permanecem cobertas até o término da celebração da Paixão do Senhor na Sexta-feira Santa; as imagens até o início da Vigília pascal(nº 26).

Em alguns lugares, existe também o costume de velar as imagens desde o início da quaresma, mas há uma razão pela qual recomenda-se fazê-lo a partir do quinto Domingo da Quaresma. Também no antigo rito, este domingo recebia outro nome: “Domingo da Paixão”, seguido da “Semana após o Domingo da Paixão” e o que hoje conhecemos por “Domingo de Ramos da Paixão do Senhor”, era chamado de “Segundo Domingo da Paixão ou de Ramos”. A partir daquele domingo, a dimensão da conversão abre espaço para a contemplação do mistério da Paixão e Morte de Jesus Cristo por nós. Hoje ainda, mesmo depois do novo Missal de Paulo VI, esse caráter da Paixão não foi totalmente perdido: as leituras, orações e antífonas são permeadas por este clima da Paixão que se acentua, bem como os prefácios da Paixão do Senhor, que são indicados pelo Missal Romano para a Liturgia Eucarística.

Sendo assim, o costume de velar as imagens entra em sintonia com a introdução dos fiéis ao mistério que será celebrado solenemente no sagrado tríduo pascal da paixão, morte e ressurreição do Senhor. As imagens cobertas possibilitam aos fiéis que centrem a sua atenção no altar, onde se celebra a Eucaristia, memorial da morte e ressurreição do Senhor. Elas, que significam o Cristo que é glorificado nos santos (cf. CIC, 1161), quando cobertas, representam que, antes de serem glorificados em Cristo, à sua semelhança passaram também pela cruz (cf. CIC, 2015).

Não é para que se crie um ambiente assustador, mas sim para levar os fiéis a uma oração mais recolhida, penitenciando os olhos externos para que assim contemplem o mistério salvífico de Cristo com os “olhos do coração”, pela fé, associando-se em íntima comunhão com Ele.

REFERÊNCIAS:

CONCÍLIO VATICANO II. Sacrosanctum Concilium. Disponível em: <https://www.vatican.va/archive/hist_councils/ii_vatican_council/documents/vat-ii_const_19631204_sacrosanctum-concilium_po.html>.  Acesso em: 05 Mar. 2024.

CONGREGAÇÃO PARA O CULTO DIVINO. Paschalis Sollemnitatis: A Preparação e Celebração das Festas Pascais. Brasília: Edições CNBB, 2018.

JOÃO PAULO II. Catecismo da Igreja Católica. São Paulo: Edição típica Vaticana, Loyola, 2000.

MISSAL ROMANO. 3ª Ed. Brasília: Edições CNBB, 2023.

VATICAN NEWS. O rito e o Missal Romano. Disponível em: <https://www.vaticannews.va/pt/vaticano/news/2019-06/liturgia-o-rito-e-missal-romano.html>. Acesso em 05 Mar. 2024.

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